domingo, 24 de janeiro de 2016

Erva-mate, origem e beneficiamento

A erva-mate, conhecida no meio cientifico por ilex paraguariensis, é originária da Mata Atlântica e isso faz com que o mate seja uma erva típica da América do sul.  Além de chimarrão (e mate), a bebida também é conhecida por tererê, congonha, erva-verdadeira, erva-congonha, chá-mate, chá-do-paraguai, chá-dos-jesuítas, chá-das-missões, mate-do-paraguai, chá-argentino, chá-do-brasil, congonha-das-missões, congonheira, mate-legítimo, mate-verdadeiro. 

A partir dessas denominações, teorias e investigações indicam que nem sempre o chimarrão foi sinônimo de congregador ou concialiador. A origem da palavra chimarrão, vem do castelhano (cimarrón) e remete ao termo “clandestino”. Assim se adotou o mesmo radical em português, mas que na tradução ficou português. É provável que essa relação tenha se estabelecido durante o século XIX, quando o Paraguai proibiu o comércio e o preparo do mate, mas não conseguiu evitar que a erva circulasse de maneira clandestina.

Outra teoria que vem da língua espanhola estabelece que cimarrón, chucro, bruto e bárbaro é ligado ao vocábulo empregado em quase toda a América Latina, para se referir aos  animais domesticados que se tornaram selvagens. “E assim esta palavra foi também empregada pelos colonizadores do Prata, para designar aquela rude e amarga bebida dos nativos, tomada sem nenhum outro ingrediente que lhe suavizasse o gosto”. (Elucidário Crioulo, de Antonio Carlos Machado in História do Chimarrão, de Barbosa Lessa, 57). Já a teoria que deu origem a palavra mate diz tratar-se de uma derivação do quíchua matty – palavra que identificava a cuia. Enquanto que "Congonha" deriva do tupi kõ'gõi, que significa "o que mantém o ser".

Essa proibição do uso do chimarrão valeu durante o século XVI, por ter sida classificada pelos padres jesuitas como “erva do diabo”. Os religiosos perceberam que a planta possuía efeitos alucinógenos. A proibição valeu para as  Reduções Jesuítas no Paraná e no Paraguai. “Nos arrabaldes do povo de Maracayú se beneficia a erva, tão usual em todas aquelas províncias do Peru, que não há casas de espanhóis nem ranchos de índios em que ela não seja pão cotidiano e bebida. E se tem espalhado tanto este asqueroso sumo que tem chegado à corte e muitas cidades da América e da Europa seu conhecimento, uso e consumo. Em meu parecer, o demônio, por meio de algum feiticeiro, a inventou.” Francisco Jarque, jesuíta, no livro Insignes missioneros.

Na disputa pelas terras além mar, a partir dos anos de 1.500, chegaram no continente americano, portugueses e espanhóis. No século XVII, chegaram os Jesuítas da Companhia de Jesus com a missão de catequizar os índios que viviam no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Os primeiros padres jesuítas chegaram à região do Guairá - hoje leste do Paraguai, oeste do Paraná e sul do Mato Grosso do Sul. 


Nas suas pregações, os jesuítas observaram que o consumo da bebida entre os índios Guarani e Kaingang era bastante popular. Primeiro os jesuítas a classificaram como “erva do diabo”, por terem percebido que a bebida os deixava mais dispostos e ativos. Alguns que se recursaram a deixar o hábito foram excomungados. Mas, a medida em que os padres aumentavam a interação com os nativos, alguns também aderiram ao hábito. Até hoje o tererê é muito popular no Paraguai, no Mato Grosso do Sul e no oeste do Paraná. Os jesuítas, seguindo o exemplo dos ingleses, que tomam o seu chá quente, resolveram esquentar a água do tererê. Assim nasceu o chimarrão como é conhecido hoje. 

Com isso, a partir do século XVII, esses religiosos passaram a incentivar o uso da bebida para combater o consumo excessivo dos derivados de alcoólicas e outras drogas. Os missionários percebessem que os índios, sem o chá da planta,  pioraram o desempenho no trabalho. Os padres então voltaram atrás e liberaram o uso da erva-mate e passaram a inclusive a controlar as exportações dessa planta. Suas propriedades milagrosas cruzaram os mares e foram a Europa, como “chá dos jesuítas”. Por mais de século e meio (1610-1768), os padres mantiveram o comércio de seus produtos na forma de chás e chimarrão. Há registros de plantações de 500 hectares na região das missões jesuíticas. Até 1632 a extração da erva-mate foi a principal atividade econômica da Província Del Guairá, território que abrangia quase todo o Paraná. Os padres missionários também elaboraram técnicas para a colheita e cultivo da planta. 

Mesmo ainda no século 17, o general espanhol Domingos Martínez Irala, ao entrar em contato com os indígenas da região da atual cidade de Guaíra, no Paraná, difundiu a bebida para os povoados espanhóis onde hoje é o Paraguai. Em 1626, os padres chegaram ao Rio Grande do Sul, mas já em 1641 foram expulsos pelos bandeirantes. Em 1682 eles voltaram e formam a partir de então as famosas Reduções das Missões edificando sete grandes redutos. Assim, aos poucos, esse “chá” foi incorporado a também chamada sociedade branca. 

A erva-mate foi classificada em 1820 pelo botânico francês Saint-Hilaire, após observar os ervais nativos. Ele teve contato com a árvore no Paraguai e depois observou os ervais nativos nos arredores de Curitiba, que no passado o espaço pertenceu aos padres jesuítas. Informações dão conta de que nomear a erva-mate com o nome científico de Ilex paraguariensis, foi um erro. Ele teve contato com a árvore de forma inicial no Paraguai, mas se retratou em livro, hoje guardado em uma biblioteca de Paris. O naturalista reconheceu que seria mais adequado tê-la chamado de Ilex brasiliensis. Pois descobriu, que era no Brasil, que a erva-mate era nativa em maior quantidade e melhor qualidade. “As folhas verdes da árvore do mate são inodoras, de sabor herbáceo e um pouco amargo; mas preparadas, desprendem suave perfume que se assemelha mais ou menos ao do chá suíço”. (August de Saint-Hilaire, em Viagem à comarca de Curitiba (1820))

A palavra chimarrão se difundiu de forma significativa a partir do século XIX. O mercado exportador também foi alterado. Quando da proibição da exportação de erva-mate no Paraguai, países como Uruguai e Argentina começam a consumir o produto brasileiro. Devido à indústria do mates foram criados novos povoados que gerou capital e trabalho, principalmente em Santa Catarina e Paraná. Em 1840, os barbaquás – unidades de processamento da erva-mate com fornos de secagem – foram considerados a primeira indústria brasileira. O Paraná foi tão beneficiado com planta que se criou na região o chamado Ciclo da Erva-Mate. Assim deixou de ser a “Quinta Comarca” da província de São Paulo. O Paraná conquistou a emancipação em  15 de dezembro de 1853. Seus produtos da década de 1920, chegaram a ser moeda na época e principal produto brasileiro de exportação.


Durante os séculos XVIII e XIX, o chimarrão foi a bebida oficial do gaúcho. No entanto, a partir do início do século XX, o consumo do “mate amargo” começou a entrar em declínio. Uma das explicações para isso pode ter sido a grande influência dos hábitos americanos e franceses que invadiram o estado naquela época. Nesse período, o gauchismo estava em declínio, era visto como algo atrasado, conservador. Além dos jesuitas, outra explicação sobre a difusão da erva-mate no Rio Grande do Sul se dá a partir da presença dos soldados espanhóis que chegarem à foz do Rio Paraguay, em 1536. Depois de fundarem a primeira cidade da América Latina, Assunción de Paraguay, esses desbravadores passaram a exagerar nas bebidas acollicas para justificar a saudade familiar. A ressaca era aliviada ao tomar chá da erva-mate. Foi assim, que a erva-mate teria chegado ao Rio Grande do Sul, transportada na garupa dos guerreiros daquela época. Mesmo porque naquele período o estado gaúcho era também território ligado a coroa espanhola.

A principal causa que explica a expansão do hábito de beber o chimarrão, são as invasões dos bandeirantes as reduções em busca de índios para escravizar. Com a retirada dos padres jesuítas, os tropeiros, bandeirantes e mascates mantiveram a comercialização do produto, no lombo das tropas de mulas, desde o Rio Grande do Sul até Minas Gerais. No ano de 1804, há registros do Porto de Paranaguá, da intensa exportação brasileira de erva mate, que passaram a ocupar os porões de navios, viajando milhares de quilômetros até atingir mercados europeus, americanos e principalmente os países do prata.

Já o médico alemão Roberto Avé-Lallemant (1812-1884) visitando o Rio Grande do Sul em março de 1858, inicia o movimento que faz o chimarrão ser hoje reconhecido pelo seu elo congregador: “O símbolo da paz, da concórdia, do completo entendimento – o mate! Todos os presentes tomaram o mate. Não se creia, todavia, que cada um tivesse sua bomba e sua cuia própria; nada disso! Assim perderia o mate toda a sua mística significação. Não há nisso, nenhuma pretensão de precedência, nenhum senhor e criado; é uma espécie de serviço divino, uma piedosa obra cristã, um comunismo moral, uma fraternidade verdadeiramente nobre, espiritualizada! Todos os homens se tornam irmãos, todos tomam o mate em comum!” (Viagem pelo Sul do Brasil, 1.º, 191. Rio de Janeiro, 1953).

Com o passar do tempo, aliado ao crescimento populacional europeu no sul da América, o hábito de tomar chimarrão ou tererê ganhou ainda mais adeptos. Além do Brasil, a bebida é consumida na Argentina, no Uruguai, no Paraguai e em algumas localidades do Chile, do Bolívia e do Peru. Nos três primeiros países, o mate é reconhecido como bebida nacional. Os argentinos são os maiores produtores de mate do mundo. A Síria, Líbano e Arábia Saudita estão entre os maiores consumidores do mate hermano. Enquanto que na Tailândia é considerado produto nobre, na China o consumo ocorre dissolvido em leite de soja. A erva-mate é pouco popular na Europa e nos Estados Unidos, pois lá o café ainda é mais apreciado.

Passados mais de 500 anos, o processo de colheita ainda é feito em sua maioria pelo modo artesanal. Isso significa que é necessário tirar galho a galho. Mesmo após todos os esses anos, o ciclo de colheita da planta se mantém de dois em dois anos. A extração da erva-mate é significativa economicamente em muitos municípios brasileiros. De acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, no Brasil, a erva-mate é explorada economicamente em cerca de 560 municípios do Paraná, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e de Mato Grosso do Sul, totalizando mais de 110 mil hectares. O produto é cultivado em 180 mil propriedades e gera mais de 710 mil empregos diretos. O chimarrão, o tereré e o chá-mate são, pela ordem, os principais produtos da cadeia produtiva.

Atividade agrícola é típica da agricultura familiar, desenvolvida em pouca área de terra, mas que agrega renda na propriedade rural. As técnicas de plantio requerem atenção, já que os melhores dias são os dias sem sol. A plântula é sensível ao sol e isso exige sombreamento até uma certa maturidade. As plantas nativas se reproduzem por meio de pássaros por chegarem a terra já escarificada. A erva-mate também é uma espécie-chave na composição de Sistemas Agroflorestais no Sul do Brasil, como a araucária. Pesquisadores afirma que a melhor erva-mate é a que tem as folhas extraídas do interior da floresta.

A erva-mate consumida hoje no Brasil é colhida e desidratada com fogo indireto. Isso garante – segundo estudos universitários - a manutenção do sabor e das propriedades medicinais. Depis desse processo, ela é moída, empacotada e segue para o mercado. A segmentação do principal ingrediente do chimarrão tem destaques a Nativa, proveniente de plantas colhidas em seu habitat natural; a Tradicional, geralmente não nativa, cuja composição tem 70% de folhas e 30% de caule; a Moída Grossa, mais encorpada e com sabores mais complexos; e a Pura Folha, constituída apenas pelas folhas da Ilex paraguariensis.

A erva-mate é submetida a normas legais para o processamento industrial, desde a área produtiva até atingir o consumidor final. Os critérios são estabelecidas pelo Governo Federal e pelos próprios estados. De maneira geral, as implicações legais mais significativas são impostas pelo Ministério da Saúde e pelo Ibama. A portaria nº 118, de 12 de novembro de 1992, do Ibama regularizou a exploração e a comercialização da erva-mate. É necessário observar  técnicas que visem aumentar a produção de folhas e diminuir os danos aos ervais. Para a comercialização (bruta, semi-elaborada ou beneficiada), a portaria estabelece os seguintes tipos e padrões: bruta verde, cancheada não padronizada, cancheada padronizada, cancheada padronizada semi-elaborada e beneficiada (chimarrão ou chá). As pessoas físicas ou jurídicas envolvidas no beneficiamento e/ou comercialização da erva-mate são obrigadas a fornecer ao Ibama anualmente, até 15 de fevereiro, informações sobre o consumo e a produção.

A organização do setor passa fundamentalmente pela produção de alimento seguro, rastreabilidade e profissionalização no cultivo da erva-mate. A produção de um alimento seguro tem a ver com os cuidados para evitar a contaminação química, física e biológica. É preciso levar para o setor a rastreabilidade, que é controle do produto desde a origem, na propriedade, até o consumidor.

Os principais países que importam a erva-mate do Brasil são Uruguai, Chile e Estados Unidos. O mercado teve uma série de dificuldades nos últimos anos, por questões de câmbio e algumas barreiras, mas, mesmo assim, se manteve estável, com produção e venda estabilizados. Esse é um setor forte. Agora, queremos fugir das barreiras regionais e buscar ampliar os mercados.

Rendimentos
A árvore de erva-mate leva aproximadamente oito anos para ter uma produção razoável. Isso é provavelmente um dos principais motivos que tem condicionado a substituição da cultura por outras de resultado mais imediato. Segundo estudos da Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER/RS), a muda deve ser plantada entre os meses de maio e setembro, em solos profundos e com alto teor de umidade.

Recomenda-se que até o quinto ano apos o plantio o solo seja capinado para a extração de ervas daninhas. A erva-mate precisa de uma área limpa para o seu desenvolvimento. No entanto, depois de estar madura, a planta se torna bastante resistente. Uma das principais inimigas da muda de erva-mate são as chamadas formigas cortadeiras (saúvas e quem-quem), que as atacam no viveiro e no campo. O controle dessa praga deve iniciar antes mesmo do plantio, e o ideal é que seja feito durante todo o ano.

A colheita nas plantações de erva-mate pode ser de dois tipos, tradicional ou sistematizada moderna. A extração em uma lavoura de baixa densidade (1.100 plantas por hectare) pode ser feita a cada dois anos, a cada ano e meio ou até mesmo anualmente. Segundo os técnicos da EMATER/RS, para os diferentes tipos de colheita tradicional, em plantações com 1.100 plantas por hectare, idade média de 30 anos e manejo adequado de solo, é possível se atingir os seguintes rendimentos de toneladas por hectare plantado:

Média: 6.000 kg folha verde/hectare/ano
Máximo: 9.000 kg folha verde/hectare/ano
Mínimo: 3.000 kg folha verde/hectare/ano

As plantações com 1.900 a 4.400 plantas por hectare, utilizam o sistema de colheita sistematizada moderna. Nesses casos, a extração é feita anualmente, e o aproveitamento por hectare é maior do que no método tradicional. Os rendimentos médios das lavouras que utilizam esse sistema são os seguintes:

Media: 8.500 kg folha verde/hectare/ano
Máximo: 12.000 kg folha verde/hectare/ano
Mínimo: 5.100 kg folha verde/hectare/ano

http://www.ufrgs.br/ensinodareportagem/economia/ervamate.html
http://www.sindimaters.com.br/pagina.php?cont=sindimate.php&sel=2

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